Lobista do setor de gastronomia em Curitiba, Fábio Aguayo postou a foto dele com Deltan Dallagnol, Diogo Castor de Mattos e Sergio Moro. Era a festa de aniversário de Castor de Mattos. Outra foto tirada no mesmo evento mostra ainda o jornalista Marc Souza, atual secretário de comunicação da Prefeitura de Curitiba, que tem Eduardo Pimentel como titular. A foto é o retrato da impunidade.
A começar pelo aniversariante. Castor de Mattos recebeu a pena de demissão do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em outubro de 2021, mas essa decisão até hoje não foi cumprida, por decisão de uma juíza de primeira instância da Justiça Federal de Curitiba, confirmada no ano passado pelo Tribunal Regional Federal da 4a. Região, sem que tenha havido contestação.
O representante do Ministério Público Federal nesse tribunal não quis recorrer, apesar de disposição em contrário da Procuradoria Geral da República.
Deltan Dallagnol, que teve Castor de Mattos como seu estagiário, foi cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral por uma manobra ilegal que o livrou de uma possível condenação no CNMP.
Dallagnol respondia a procedimentos administrativos na instituição e, na iminência de uma condenação que o impediria de se candidatar, pediu demissão do Ministério Público Federal. O TSE entendeu que ele se furtou à aplicação da lei depois de iniciados os procedimentos e, portanto, o registro de sua candidatura a deputado federal foi considerado inválido.
Sergio Moro se demitiu do Poder Judiciário antes que se iniciasse qualquer processo administrativo no CNJ e, nesse sentido, teve a candidatura a senador válida. Mas depois foi submetido a uma investigação no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná por abuso do poder político.
O TSE o absolveu, uma decisão que contrariou as expectativas e ocorreu depois que o então presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, esteve com o presidente da corte, Alexandre de Moraes.
Em jogo, estaria a sucessão na casa legislativa, e Moro teria manifestado disposição de se unir a um grupo de senadores que não votaria em Davi Alcolumbre, aliado de Pacheco. Este teria atuado em defesa de Moro, para não colocar em risco a eleição de Alcolumbre.
Seja como for, a investigação não foi até onde deveria. O partido de Moro, o União Brasil, pagou R$ 1 milhão para o advogado Luís Felipe Cunha, que era candidato a primeiro suplente na chapa do ex-juiz. Moro admitiu que Cunha não prestou serviços como descrito no contrato, o que caracterizaria a falsidade ideológica do documento.
Seu advogado eleitoral de fato, Gustavo Guedes, recebeu muito menos por serviços prestados. Para onde foi o dinheiro pago ao primeiro suplente de Moro? Uma investigação poderia ter resultado na quebra de sigilo bancário de Cunha, para saber se houve transferência ao ex-juiz ou pagamentos de interesse deste.
Não houve, entretanto, quebra de sigilo bancário. “Se Moro fosse juiz do caso, ele teria mandado prender o investigado Moro”, disse o advogado Guilherme Gonçalves, especialista em direito eleitoral e que, por ter a petista Gleisi Hoffmann como sua cliente, acabou perseguido e preso pela Lava Jato, em 2017.
Há algumas semanas, o ministro Dias Toffoli anulou o processo contra Guilherme Gonçalves, em razão da parcialidade de Sergio Moro, admitida pelo Supremo Tribunal Federal. Moro é hoje pré-candidato ao governo do Paraná em 2026, e agora tem sobre si uma nova representação na Justiça Eleitoral, a de que estaria realizando campanha antecipada.
Fábio Aguayo, o autor da postagem, foi citado no depoimento do advogado Rodrigo Tacla Duran, no depoimento ao juiz Eduardo Appio, em maio de 2023. Alguns dias depois, Appio foi afastado pelo Tribunal Regional Federal da 4a. Região. Segundo Tacla Duran, Aguayo o procurou quando era investigado pela Lava Jato.
Na companhia do advogado Carlos Zucolotto Júnior, ele teria oferecido serviços que Tacla Duran entendeu como insinuação de propina. Este é um dos temas que Tacla Duran trataria no depoimento que ocorreria presencialmente na Polícia Federal em Curitiba, por determinação de Appio.
Ameaçado de prisão por um amigo de Moro, o desembargador Marcelo Malucelli, do TRF-4, Tacla Duran deixou de vir ao Brasil e hoje é impedido de deixar a Espanha, por decisão da Procuradoria da Justiça de lá, que se recusa a cumprir uma determinação do STF.
A corte constitucional do Brasil suspendeu os processos contra o advogado, em razão dos indícios de que sofre perseguição na Justiça Federal do Sul. Os procuradores espanhóis, no entanto, se recusam a aceitar essa decisão e devolver o processo ao Brasil. Por tratados internacionais, deveria fazê-lo, já que a Justiça brasileira é que iniciou a ação. Um caso estranho, que mereceria reação mais dura do Brasil, o que ainda não ocorreu.
Por fim, o jornalista que aparece na foto, Marc Sousa, foi o autor da postagem em seu blog de uma notícia falsa, em que o site The Intercept Brasil aparece como destinatário de uma doação de pessoas ligadas ao PCC.
Era mentira e sugere uma armação para se vingar do Intercept, veículo que divulgou parte das mensagens acessadas pelo hacker Walter Delgatti Neto, um caso batizado de Vaza Jato, que revelou conluio entre Moro e os procuradores da Lava Jato.
Marc Souza era apresentador da Record e comentarista da Jovem Pan, e a publicação em seu blog ocorreu pouco antes de uma entrevista com Moro, afiliada da Record em Curitiba.
Enfim, essa é a ficha corrida da turma que se reuniu para festejar o aniversário de Castor de Mattos. A postagem da foto deveria envergonhar a Procuradoria Geral da República, que, até agora, não tomou nenhuma providência diante de duas investigações consistentes.
Uma delas é a do CNJ, que relatou fatos que caracterizam, em tese, crimes de peculato, corrupção e lavagem de dinheiro de recursos recebidos em nome da Petrobras. A outra investigação faz parte do inquérito da Polícia Federal, aberto depois das denúncias de Tony Garcia, ex-agente infiltrado de Moro, apresentadas à TV 247.
A pergunta que não quer calar: para os lavajatistas, o crime compensa?