Brasil responderá ao tarifaço de Trump com pragmatismo e sem prejudicar sua economia, diz Celso Amorim

Fonte: Conexaopb com 247

Publicada às 01/04/2025 08:53

O assessor especial da Presidência da República, Celso Amorim, afirmou que o Brasil está preparado para reagir ao novo tarifaço prometido pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, mas sem adotar medidas que possam comprometer a economia nacional. Em entrevista ao Valor Econômico, publicada nesta segunda-feira (1º), Amorim disse que o governo brasileiro prefere negociar, mas já intui onde poderá agir caso a tentativa de diálogo não prospere.

“Não adianta tomar uma contramedida que seja um ‘tiro no pé’. Mas tem medidas que afetam eles [os EUA]”, declarou Amorim, ao explicar que o país está atento às opções disponíveis. Ele citou como exemplo a retaliação cruzada utilizada pelo Brasil no contencioso do algodão na OMC, quando os EUA foram atingidos na área de propriedade intelectual. “O direito de legítima defesa é sagrado na política internacional”, reforçou.

Para Amorim, o novo movimento de Trump na arena comercial aumenta o risco de o mundo ser dividido em grandes zonas de influência entre Estados Unidos, China e Rússia. “Temos que contrabalançar uma certa tendência que a gente vê de querer dividir o mundo muito claramente em regiões com áreas de influência. Temos que trabalhar no mundo verdadeiramente multipolar”, afirmou.

Nesse cenário, o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia ganha importância estratégica. “A Europa está meio perdida também depois dos discursos do Trump e dos discursos do J.D. Vance na conferência de Munique. Então, o acordo é uma maneira de contrabalançar”, afirmou o assessor.

Apesar das críticas, Amorim considera que Trump, em seu segundo mandato, adota uma postura menos ideológica do que em sua primeira passagem pela Casa Branca. “Paradoxalmente, eu acho o Trump 2 menos ideológico do que o Trump 1. Ele se quebra de todos os valores. Mas ele está conversando com a Rússia”, disse, ao comentar a postura do republicano em relação à guerra na Ucrânia. “A partida [para o fim da guerra] foi dada pelos EUA. Disso não tem dúvida”, completou.

Amorim se mostra mais otimista com uma eventual resolução do conflito ucraniano do que há seis meses, quando Joe Biden ainda estava no comando dos EUA. Ele revelou que o Brasil vem mantendo contatos com o gabinete do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, e que o país é visto como um interlocutor relevante. “Agora estão procurando muito, e têm dito, inclusive, que o Brasil é um ator”, revelou.

A guerra na Ucrânia deve estar entre os temas das viagens internacionais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que em maio visitará a China e a Rússia. Em Pequim, Lula tratará com Xi Jinping sobre investimentos em infraestrutura e cooperação financeira. Em Moscou, participará das celebrações dos 80 anos do Dia da Vitória e se reunirá com Vladimir Putin.

Sobre a relação com a Rússia, além do papel diplomático, Amorim destacou a relevância comercial, especialmente nas áreas de fertilizantes e alimentos. Contudo, reconheceu que o cenário de guerra impõe limitações. “Enquanto o país está em guerra, também não dá para você fazer exigência”, observou.

Questionado sobre os riscos que a atuação de aliados de Jair Bolsonaro nos EUA poderia representar para as relações bilaterais, Amorim foi direto: “Ele [Eduardo Bolsonaro] vai tentar, mas eu acho que uma coisa é o Bolsonaro aqui no poder e ser o Trump dos trópicos. Outra coisa é o presidente Lula trabalhando pela união nacional, conversando com todo mundo, tendo uma relação civilizada com os presidentes da Câmara, do Senado, com o Judiciário”.

Para o assessor, o momento internacional reforça a urgência da retomada de instâncias de integração regional e da reforma do sistema multilateral. “É uma batalha difícil, há muita incompreensão, mas eu acho que temos que voltar a pensar na Unasul. Não pode abandonar, são coisas muito importantes”, afirmou.

Ao final da entrevista, Amorim enfatizou que o Brasil buscará se manter como um ator relevante e soberano em um mundo em transformação. “Não queremos ficar no quintal de ninguém”, concluiu.